Um espaço dedicado às minhas presunções e reflexões sobre os mais diversos filmes que eu, viciado em cinema, vi, vejo e verei. Assim, posso tentar estipular um debate bacana sobre o cinema em si.

segunda-feira

Indignação daqueles que enxergam

Caros leitores,

Depois de prolongada ausência, volto com críticas a filmes, e nesse post coloco os filmes que causam o que representa o título colocado acima. É representativo vendo o mundo à nossa volta e as perspectivas de mudança daqui pra frente. Boa leitura!

HOTEL RUANDA - De: Terry George; Com: Don Cheadle, Nick Nolte, Joaquin Phoenix

Uma das maneiras mais interessantes de se avaliar as intenções de Terry George na concepção de seu Hotel Ruanda talvez seja através do acompanhamento dos sentimentos expressos por alguém alheio à realidade de países sub-colonizados por grandes potências, no passado e no presente. Provavelmente essa pessoa mal sabia em que lugar da África fica Ruanda e nunca ouvira falar no genocídio por lá ocorrido há cerca de uma década. Ao longo da projeção, várias vezes verteu lágrimas indignadas contra a vileza do ser humano, que mata cruelmente seus compatriotas, sem compaixão mesmo para com inocentes crianças. Emocionado ao fim da sessão, provavelmente sairá com a sensação de algum tipo de dever social cumprido, tanto pelo filme, ao denunciar ao mundo semelhante infâmia, tanto por ela própria, ao dedicar 2 horas de sua vida a informar-se sobre uma tragédia ocorrida em uma nação distante. Após o cinema, tomará com algum amigo um café ou um sorvete e seguirá sua rotina classe média, tentando esquecer ao máximo a tragédia cotidiana vivida na cidade que a cerca.

Encarado sob esse prisma, Hotel Ruanda aparenta cumprir de forma bastante objetiva sua função, conforme a concepção de seu autor: a denúncia, usando artifícios de grandiloqüência, de uma situação trágica ao restante de um mundo que insiste em ignorá-la. Parte do ponto de vista de um protagonista, no caso o gerente de hotel Paul (Don Cheadle), que mesmo vivendo o contexto do universo onde a tragédia se implanta, segue mantendo-se distanciado, ou mesmo alienado, até o momento em que, envolvido pelos fatos, faz-se necessária uma tomada radical de posição. Através desse protagonista, ponte de identificação com o espectador, o cineasta vai apresentando o tema espinhoso, de forma gradativa para não chocar a audiência de imediato, conseguindo sua adesão para a vivência de um contexto que só se mostra presente em sua maior intensidade após pouco mais da metade da narrativa. Caminha então para uma conclusão que, após uma enxurrada de elementos melodramáticos, termina em alguma forma de expiação ou reencontro que acabaria por provocar uma espécie de catarse emotiva na platéia, que sairia do cinema impressionada por um filme de tamanha relevância social.

O que Terry George parece ter ignorado é que para se fazer um bom filme é necessário muito mais que um tema bombástico, conteúdo sócio-político relevante e mesmo fidelidade aos fatos reais. É também preciso um mínimo de inteligência e sutileza. George limita-se a seguir com o mais intenso rigor a receita de bolo apresentada no parágrafo anterior, sem jamais ceder espaço à criatividade ou a qualquer intenção de subvertê-la em algum momento, usando do melodrama previsível no seu desfecho como figura representativa da obra. É uma fórmula consagrada há décadas, que tem em Costa-Gavras seu expoente máximo, e que, em outros tempos, muito lhe rendeu respeito por parte daqueles que buscariam algum tipo de “cinema com conteúdo”, porém Terry George ainda tem muito a caminhar para chegar ao nível do diretor de obras como Z e O Quarto Poder.

EDUKATORS - De: Hans Weingartner

Vi esse filme indicado por vários companheiros que congregam do meu pensamento de sociedade, e confesso q tomei um susto com tamanho discurso panfletário nas linhas do roteiro. Protesto anti-exploração de crianças, discursos sobre revolução, me senti na Universidade ouvindo os radicalistas. Podemos enxergar superficialmente esse filme como um avanço em termos de denúncia, mas a forma utilizada, baseada em jargões e fórmulas batidas: triângulo amoroso entre dois amigos e namorada de um deles, q a principio odeia o amigo, mas depois troca o namorado pelo amigo; elementos de linguagem e simbologia atrasada na condução no filme até o momento-chave do filme, q é a ida dos Edukators para a casa de montanha.

A partir daí o filme merece um parêntese, q é uma discussão q poucos filmes q tentam passar mensagens progressistas consegue alcançar ou desenvolver: a realidade que coloca um jovem idealista a se tornar um dos braços do capital. Sim, o principal personagem dessa película é o ricaço sequestrado, pois ele é o grande mistério que não consegue ser resolvido, quais as condições de organização revolucionária evitariam a transformação de um militante aguerrido em um trabalhador capitalista?

Esse é o ponto-chave q o filme se esquiva de aprofundar, preferindo ficar na história verossímil dos jovens voluntaristas, providos do discurso correto, mas o usando de maneira pirraçenta, como jovens mimados querendo gritar contra o mundo. Perdeu-se aqui uma ótima oportunidade de dar um passo á frente na discussão de uma sociedade e de um mundo melhor, ao não querer sair da utopia romântica q vive desde os anos 60 e partir para a realidade próxima do futuro caótico com a barbárie do capitalismo moderno no mundo.

O filme de maneira geral é um filme bom, mas quem aguarda filmes profundos sobre como se dá a construção de uma alternativa a essa catástrofe de sociedade que vivemos, confesso que soa um pouco decepcionante e, porque não, constrangedor para aqueles que acreditam na luta contra o neoliberalismo.

Buenas,

Cadu